Bezerra da Silva: A Voz Política dos Morros e Favelas que Ecoa Através de Suas Canções
- Zull Ramos
- 7 de out.
- 3 min de leitura

Bezerra da Silva: A Voz Política dos Morros e Favelas que Ecoa Através de Suas Canções
Conhecido como o "Embaixador dos Morros e Favelas", o sambista pernambucano radicado no Rio de Janeiro, Bezerra da Silva, imortalizou em sua obra a crônica social das comunidades marginalizadas, tornando-se um porta-voz das suas dores e da sua resistência. Suas músicas, repletas de críticas sociais e políticas, não apenas embalaram rodas de samba, mas também deram voz a compositores anônimos das periferias, consolidando um legado que transcende a esfera musical.
José Bezerra da Silva, nascido em Recife em 1927 e falecido no Rio de Janeiro em 2005, teve uma trajetória de vida marcada por dificuldades que se refletiram em sua arte. Antes de alcançar o estrelato, foi pintor de construção civil e viveu no Morro do Cantagalo, experiências que o aproximaram da realidade que mais tarde retrataria em suas canções. Com um estilo único no samba, especialmente no partido-alto, Bezerra da Silva se destacou por sua voz rouca e por uma interpretação carregada de autenticidade.
O Cronista Musical da Injustiça Social
Mais do que um sambista, Bezerra da Silva foi um cronista social. Suas letras, muitas vezes em forma de diálogos e narrativas, abordavam sem rodeios a violência policial, a corrupção, as desigualdades sociais e o cotidiano do "malandro" – figura que em suas músicas representava o indivíduo que sobrevive à margem da sociedade, com suas próprias leis e códigos de honra.
Em canções como "Malandragem Dá um Tempo", Bezerra da Silva não fazia apologia ao crime, mas expunha a complexa teia de relações sociais que levavam à marginalização. A sua música era um espelho da realidade de quem não tinha voz na grande mídia, um retrato fiel do dia a dia nas favelas, com suas alegrias, tristezas e, sobretudo, sua luta por dignidade.
A veia política de Bezerra da Silva se manifestava na forma como ele denunciava a hipocrisia e o descaso das autoridades. Em "Meu Bom Juiz", por exemplo, ele questionava a seletividade da justiça, enquanto em "Justiça Social" clamava por direitos básicos para a população pobre. Suas músicas eram um contraponto ao discurso oficial, oferecendo uma perspectiva de dentro das comunidades.
O Megafone dos Compositores do Morro
Uma das facetas mais importantes da carreira de Bezerra da Silva foi o seu papel como intérprete de compositores desconhecidos do grande público. Ele fazia questão de garimpar talentos nos morros e favelas do Rio de Janeiro, gravando e dando visibilidade a canções que, de outra forma, talvez nunca saíssem do anonimato das rodas de samba locais.
Nomes como Noca da Portela e Sérgio Mosca, autores de "Eu Sou Favela", encontraram em Bezerra da Silva o intérprete ideal para suas composições. A sua decisão de gravar esses artistas não era apenas artística, mas também um ato político, uma forma de legitimar e valorizar a produção cultural das periferias. Ele se via como um "porta-voz" e, com isso, ajudou a construir uma identidade musical para as comunidades que representava.
Ao dar voz a esses compositores, Bezerra da Silva não só enriqueceu o seu próprio repertório, mas também democratizou o acesso à indústria fonográfica, ainda que de forma limitada. Ele entendia que a verdadeira sabedoria popular estava na vivência e na criatividade do povo, e fez de sua carreira uma plataforma para que essas vozes pudessem ser ouvidas.
O legado de Bezerra da Silva, portanto, vai muito além de seus 11 discos de ouro e 3 de platina. Ele se consolidou como uma figura de resistência cultural e política, um artista que usou o samba como ferramenta de denúncia e de afirmação de uma identidade. Suas canções continuam atuais, um lembrete contundente das feridas sociais de um Brasil que ele tão bem soube retratar em seus versos.






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